O futebol como um fenômeno da cultura brasileira

As coisas só acontecem por acaso, necessidade ou vontade nossa! Epicuro - filósofo.

quinta-feira, 4 de setembro de 2008

A grandeza dos pequenos


Prometemos continuar uma conversa iniciada na coluna da semana passada acerca da grandeza e da pequenez de todas as coisas. A idéia de fundo, enraizada em todas as culturas, é a de que sempre nos orientamos sob os dados da realidade baseados num providencial senso de horizontalidade e, principalmente, de verticalidade. Isto é, consideramos sempre que há coisas superiores – os gestos nobres, as ações heróicas, por exemplo –, mas também coisas pequenas, inferiores, tais como os gestos mesquinhos, as ações pusilânimes, enfim, as atitudes ou covardias inclassificáveis.
Trazendo a discussão para o mundo do futebol, nos debatemos sempre com o hábito de colocarmos num patamar superior de nossa consideração e estima os chamados clubes grandes como o Flamengo, Corinthians, Grêmio, Palmeiras, Vasco, entre outros; e, por oposição de valores, empurramos para a prateleira dos cacarecos insignificantes os ditos clubes pequenos, a exemplo do Brasil de Pelotas, Baré de Roraima, Fast Clube do Amazonas, Dom Pedro do Distrito Federal, Gurany de Sobral, Sinop do Mato Grosso, e, principalmente, a estrela maior dessa constelação de times menores: o Íbis, de Pernambuco, que tem esta posição de destaque entre os pequenos por ser considerado unanimemente como “o pior clube do mundo”, com inscrição no livro dos récordes e tudo.
Trouxe o Íbis para esta nossa conversa de fim de semana porque entendo ser ele (o glorioso Íbis, o pior de todos os times do planeta) um exemplo palpitante do quanto é arbitrária a nossa maneira hierárquica de olharmos para a realidade. Dissemos, no nosso início de conversa da semana passada que algo pode ser grande justamente por comportar-se como algo pequeno, humilde na sua maneira de ser, nem soberbo nem ostentatório das virtudes que lhes é constituinte, enfim, singelo na sua grandeza de ser pequeno. O contrário também bem que pode acontecer, como na música de Gilberto Gil: algo tornar-se pequeno justamente por insistentemente querer ser grande, pretender assentar a existência num patamar além dos limites do seu próprio tamanho, ostentar uma grandeza que nada mais é do que a face oculta da sua própria pequenez.
É aqui, meus caros leitores, que reponta a grandeza do Íbis no cenário do futebol brasileiro. Não se preocupando em querer ser o melhor, o maior, contenta-se na modéstia de ser o pior, e por isso é grande. E a sua grandeza, com efeito, é invejável. Alguém já viu o Íbis perdendo o sono por estar metido em dívidas impagáveis? Pois este não é o atual caso do Flamengo, do Vasco e de muitas outras figurinhas carimbadas do futebol brasileiro, que só sobrevivem emburrando os débitos (e alguns dirigentes) com a barriga? Não, o caso do Íbis é outro, porque o Íbis é grande. Grande até na sua infinita generosidade. Lembre-se, a propósito, aquela fase horrível da Seleção Brasileira pré-pentacempeonato quando estava ameaçada de não passar das eliminatórias da Copa do Mundo perdendo para alhos e para bugalhos. Ante a esquiva de várias seleções do mundo em não querer disputar jogos amistosos com o Brasil (para treinar o nosso escrete, pasmem!), foi o Íbis quem se ofereceu para esta cívica e patriótica missão.
Até no seu metier político, o Íbis é exemplarmente grande. Foge à regra de baixarias e de sopapos que comanda os ditos grandes clubes quando estes entram em processo eleitoral para a escolha de sua elite dirigente. Aqui, mais uma vez, mirem-se, senhores, no exemplo do Íbis e meditem sobre a contingência humana de ser grande ou de ser pequeno. Convoco as crônicas para vos ajudar porque elas não mentem jamais. O episódio ilustrativo deu no Diário de Pernambuco, edição de 16 de novembro do corrente, sob o modesto título: Íbis - Ozir Júnior é o novo presidente. E segue singularmente o texto:
“Confusões, brincadeiras e, claro, inúmeros fatores inusitados marcaram a sempre esperada eleição para presidente do Íbis, realizada ontem, em um bar do bairro do Ponto de Parada, próximo ao clube Madeira do Rosarinho – local anteriormente marcado para o pleito. Na última hora, as portas do clube estavam fechadas e ninguém tinha as chaves. Mas as eleições não poderiam ser adiadas e, em consenso, os candidatos decidiram fazer a votação no barzinho do outro lado da rua.
Eram seis candidatos – Ozir e Omar Júnior (filhos de Ozir Ramos), Joaquim Caldas, Ângelo Duarte, Sóstenes Mesquita e Ricardo Lessa – mas antes mesmo de abrir a urna, um deles desistiu em favor da candidatura de Ozir Júnior. Já na mesa do bar, todos reuniram-se e, em consenso, decidiram reduzir a eleição para duas chapas, colocando os principais candidatos, Ozir Júnior e Joaquim Caldas frente a frente.
Cinco candidatos, quatro conselheiros (de quase 60 existentes) e dois sócios torcedores (de quase 10 mil que possuem a carteirinha do clube) apareceram para votar. Não tinha urna eletrônica, nem sequer cédula eleitoral. Era apenas um pedacinho de papel rasgado onde cada um escrevia o nome do seu candidato favorito, dobrava e colocava na caixa de madeira, organizada pelo presidente da mesa e de honra do Íbis, Ozir Ramos.
A contagem dos votos foi rápida e deram a Ozir Júnior a presidência do pior time do mundo que agora volta ao poder da família Ramos. “É um absurdo. O pai do candidato é o presidente da mesa. Essa eleição deve ser impugnada, basta essa dinastia no Íbis”, protestou o derrotado Joaquim Caldas. Ozir Júnior comemorou a vitória lá mesmo na zona eleitoral e, como qualquer candidato eleito, fez suas promessas difíceis de se acreditar: ´Vou levar o Íbis à primeira divisão`, garantiu Júnior”.
Resta apenas dizer que o protesto acima foi feito em tom de brincadeira e que a seqüência do dia transcorreu na mais pura confraternização e alegria entre os dirigentes e torcedores do Íbis, clube cuja insofismável grandeza as crônicas de agora e de sempre inscrevem no livro de ouro do futebol brasileiro. Per secula seculorum, amém!
Foto de Leonardo Duarte

Um comentário:

filipe fernandes disse...

Caro Edonio

Se prepare que vem ai a Bomba sobre o Ibis Sport Club!

Em breve sera apresentado um Projeto Inovador para o clube a Nivel mundial!

Um abraço desde Recife!