O futebol como um fenômeno da cultura brasileira

As coisas só acontecem por acaso, necessidade ou vontade nossa! Epicuro - filósofo.

domingo, 16 de junho de 2013

A bola na cultura_ANÁLISE



Futebol e ciência

 

POR Edônio Alves

 

O Brasil pode estar prestes a conquistar mais dois trunfos culturais na sua história de nação independente e com prestígio cada vez mais em alta no cenário mundial. Um deles diz respeito ao patamar simbólico com que as culturas se comparam umas às outras no que elas produzem de melhor e com o que elas forma as suas imagens de si mesmo. O outro, mais concreto e com repercussões mais objetivas na vida dos cidadãos, diz respeito ao modo como as nações, diferentemente uma das outras, se empenham em resolver os problemas dos seus membros e, por conseguinte, da própria humanidade, no geral.

Refiro-me aqui ao nosso futebol e a possibilidade objetiva - embora não tão consensual assim - de o Brasil, que sedia a próxima Copa do Mundo de 2014, conquistar mais um título para a sua galeria, no primeiro caso; e a façanha científica, que também vai ser apresentada na abertura do Mundial de futebol no Brasil, de o país mostrar ao mundo a maior reviravolta conseguida no universo da neurociência, no segundo caso. Trata-se, neste episódio científico em que o futebol vai servir como pano de fundo, do projeto comandado pelo neurocientista brasileiro, Miguel Nicolelis, através do qual um adolescente paraplégico vai poder levantar-se de uma cadeira de rodas, ir até o centro do gramado da abertura da Copa e dar o pontapé inicial da competição.

Na ocasião, o jovem vai estar portando uma vestimenta denominada de exoesqueleto, o qual reproduzirá as ondas elétricas do seu cérebro, reproduzindo os comandos pensados por ele, que o fará andar e seguir o protocolo determinado pela equipe de cientistas comandada por Nicolelis. Tudo consiste na ideia, tornada prática objetiva pelas pesquisas da neurociência moderna, de que é possível o cérebro comandar máquinas através das ondas elétricas que são geradas pelo próprio ato de pensar dos humanos. Nesse caso, o tal exoesqueleto será a máquina a ser comandada pelo pensamento e vontade do jovem, escolhido para a tal demonstração científica.

Explicado o milagre, falemos agora do nome do santo.

Miguel Nicolelis é um cientista brasileiro formado na Universidade de São Paulo-USP, na década de 1980. Hoje, ele chefia o laboratório de neurociências da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, e o Instituto de Neurociências de Natal, no Rio Grande do Norte, o IINN-ELS. Nessas duas instituições, ele coordena as pesquisas que mapeiam a comunicação cérebro-máquina. Tal linha de pesquisa já aponta para inúmeros benefícios humanos que poderão advir dessa relação. Uma delas, entre várias, é a possibilidade de o ser humano amputado ou impossibilitado de mover-se, poder usar próteses ou cadeiras de rodas (máquinas, no geral) comandadas apenas pelo cérebro, sem a necessidade da ajuda de um terceiro ou do gasto da energia corporal do paciente.

 E por que eu trouxe o Nicolelis aqui para esta coluna de futebol dos domingos?

Trouxe-o porque além dele ser um dos mais renomados e importantes cientistas do mundo contemporâneo (com possibilidades futuras de até vencer o prêmio Nobel), também é um grande amante do futebol. Torcedor do Palmeiras, Nicolelis não perde a oportunidade de usar as experiências e as metáforas do futebol para explicar as suas descobertas e convicções científicas.

Certa ocasião, durante a abertura de uma palestra no Instituto Max Planck, na Alemanha, três dias depois da vitória do Brasil na Copa de 2002, realizada na Coréia e no Japão, Nicolelis abriu a aula, num auditório lotado de neurocientistas alemães sisudos, com uma imagem mostrando o esforço em vão do goleiro alemão Oliver Kahn, tentando se esticar todo para impedir mais um gol do fulminante ataque brasileiro. O título do slide era: "I Kahn't get it". Um trocadilho em inglês para "Eu não vou conseguir".

O cientista defende a tese de que nosso cérebro de primata assimila todas as ferramentas que cada um de nós utilizamos - carros, telefones, roupas, raquetes, bolas etc - como uma verdadeira extensão do nosso corpo biológico.

Concluamos, por isso agora, em arremate, com as palavras do próprio cientista Miguel Nicolelis em que ele junta futebol e ciência para explicar um pouco do fenômeno Pelé, na sua opinião o maior jogador de todos os tempos, único e insubstituível em tudo. "Se um dia alguém tivesse o privilégio de mapear o cérebro desse vulcão de duas pernas chamado Pelé, esse alguém encontraria, na região lobo parietal, não apenas a representação de um pé, mas, sim, a imagem de uma verdadeira fusão desse com aquela que foi sua mais fiel e amada companheira: a bola!". 
 
 

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